A Samaúma





Ceiba Pentandra

 
 
 
 
 
Muita "água" tem corrido ao longo dos tempos no ventre da Samaumeira...
Para uns, mãe da Floresta, para outros, da própria existência, Esta imponente árvore é fecunda de simbologias mitológicas.
Curandeira por excelência, vivifica e alimenta a vegetação que a rodeia...
Suas raízes, tão profundas quanto a sua altura, simbolizam a ligação ao mundo da ancestralidade e, portanto, à sabedoria primordial.
 
Não me vou reter em descrições e definições por haver já bastante informação a respeito. Exemplos disso são os links que se seguem:
 
 
 
 

A Samaúma e os índios Ticuna


Como apareceu o dia
 
 
Origem desconhecida
 

Naquele tempo era sempre noite. Os galhos da samaumeira cobriam o mundo, escurecendo tudo. Os irmãos Yoi e Ipi tentaram abrir um buraco na copa da árvore, jogando-lhe caroços de araratucupi, mas sem resultado. Chamaram o pica-pau, que tentou cortar o tronco com o bico, mas não conseguiu. Resolveram então tirar o machado da cutia. Ipi colou penas em todo o corpo e ficou deitado de boca aberta no caminho da cutia. A cutia estranhou a figura que encontrou no caminho e começou a fazer-lhe perguntas. Como Ipi não respondeu, ameaçou urinar na boca dele e cortar-lhe a língua. Até que ele respondeu, dizendo que podia arrancá-la. Ela se aproximou e Ipi arrancou-lhe a paleta, a perna de trás, que era o seu machado. A cutia perseguiu Ipi coxeando e gritou-lhe que, quando fizesse roça, não dissesse o nome dela e que iria cobrar-lhe o roubo, furtando nas roças que fizesse. É o que a cutia faz até hoje.

De posse do machado, Ipi começou a cortar a árvore. Mas o corte se tornava a fechar. Yoi então tentou cortar e, onde ele batia, o corte se mantinha aberto. Quando se cansou, entregou o machado a Ipi, que continuou a cortar, mas agora o corte não se fechava mais. Apesar de o tronco estar bem fino, a árvore não caía. Olhando para cima, viram que era uma preguiça que a segurava.

O quatipuru (esquilo), convidado para subir e tirar a mão da preguiça do galho, foi até a metade e desceu, com medo da altura. O quatipuru pequeno aceitou subir com formigas de fogo para jogar nos olhos da preguiça. Ele subiu e conseguiu atingir os olhos da preguiça. Deu então um pulo para trás e caiu, machucando o rabo no machado. Por isso o quatipuruzinho tem o rabo dobrado nas costas. A samaumeira caiu, e daí por diante se pôde ver o sol, o céu, as estrelas. Como recompensa, Yoi e Ipoi deram sua irmã para casar com o quatipuruzinho.

 

O coração da samaumeira

Depois de algum tempo, Ipi foi até a árvore derrubada para ver se já tinha apodrecido. Mas ela estava viva e tinha começado a brotar de novo. Ipi ouviu batidas de coração e resolveu tirá-lo. E começou a cortar com o machado. Ipi e Yoi disputavam o machado, cada qual querendo a tarefa de tirar o coração da samaumeira. Finalmente um golpe de Yoi fez o coração pular fora. Um calango (lagarto) o engoliu e ele ficou parado na garganta. Ipi encostou um tição na garganta do calango e o coração pulou fora. Mas uma grande borboleta azul engoliu o coração. Ipi queimou a asa da borboleta com o mesmo tição e ela vomitou. Por isso as borboletas azuis de hoje têm manchas na asa. O coração caiu num buraco muito apertado. Yoi então mandou a cotia roer o coração pelo lado direito, trazer o caroço e plantar no terreiro. Passado algum tempo, daí nasceu a árvore de umari.
 
 

Os Wajãpi e a Samaúma

Há muito, muito tempo, no princípio dos tempos, todos os seres vivos eram iguais. Não havia cores nem diferentes formas, línguas, cheiros, tradições, hábitos e saberes, entre os habitantes do mundo... todos eram Wajãpi.
Fonte: pib.socioambiental.org
 
            Para organizar a vida em sociedade, Ianeja (“o nosso dono”) promoveu a separação entre homens e animais, e dividindo-os por diferentes espécies.
A definição das espécies ocorreu por ocasião de uma grande festa, em que futuros homens e animais exibiam os seus cantos e as suas danças.  A aparência era a mesma em todos os seres, mas não os seus cantos e conhecimentos.
dança wajãpi, autor desconhecido

 
            Os futuros pássaros foram aqueles que, pegando em fezes de sucuriju, que eram de diversas cores, se pintaram. Foi enquanto dançavam que Ianeja os transformou em pássaros de diferentes espécies.
ilustração wajãpi, autor desconhecido
 
           E assim, araras, tucanos, mutuns, jacamins, socós (...), voaram todos para os galhos da primeira árvore que Ianejá criara: Kumaka (a Sumaúma), morada da sucuriju.
capa do livro "Ka'a rewarã
 
Foi a partir dessa grande árvore que cada pássaro seguiu o seu rumo, criando diferentes direcções, dando origem aos rios e seus afluentes.
Foi assim que os seres que dançavam à beira do primeiro rio que surgiu, caíram na água, transformando-se em peixes.
Origem desconhecida
 
Fontes:
ISA (Wajãnpi – Cosmologia; Wajãnpi – Rituais);


Tese de pós-graduação em Antropologia Social:   “No Rasto da Cobra Grande – Variações Míticas e Sociocósmicas: a questao da diferença nas Guianas”, por Majoí Favero Gongora;*O mito da grande samaumeira e o de seu coração estão divulgados em O Livro das Árvores (Benjamin Constant: OGPTB, 1997), um volume escrito e ilustrado pelos professores indígenas ticunas, que trata da importância das árvores na vida e cultura de seu povo.

Fotografia de Manuel Calado
 
  
                                                                        Fotografia de Manuel Calado